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Portifólio

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6.5.11

Comunicação


Na minha rua tem um menino muito tímido. Se alguém o cumprimenta, ele abaixa a cabeça, enrubescendo e invariavelmente sai correndo. Por esse motivo me surpreendi quando, em uma manhã, o encontrei subindo em uma árvore.

Praticamente todos os moradores da rua o desencorajavam, pedindo que descesse antes que se machucasse. Ele, obstinado, continuava como se não os ouvisse. As crianças, ao contrário, o incentivavam, pedindo que ele fosse mais alto. O menino, alheio aos gritos, escalava. Um momento seu pé escorregou, fazendo-o ralar o joelho. Não ligou. Escalou um pouco mais. Parecia ter um alvo específico: a cerejeira estava florida, mas ele queria a de coloração mais rosácea. Que ficava um pouco no alto. Na ponta.

Ele subiu em um galho, abrindo os braços para se equilibrar, indo lentamente na ponta dos pés para frente. Tremia, parava quando seus pés davam um passo em falso, mas não retirava os olhos de seu objetivo. Quando estava alcançando a tão desejada flor, algo o distraiu na rua e ele balançou. Agarrou o ramo de flores, que arrebentou com seu peso, levando os dois ao chão. 


Caiu em cima da grama, não tão fofa, mas cheia de folhas e galhos, que arranharam um pouco sua pele. Logo se levantou, antes mesmo que alguém fosse ajudá-lo. Estava sujo, arranhado, principalmente nas mãos, e sangrando no joelho. Mesmo assim, pegou o ramo de flores um pouco amassado e saiu mancando em direção a uma garotinha ruiva que era vizinha. 

Seu rosto transparecia o medo de que ela não aceitasse o presente que tanto trabalho tivera para conseguir, mas seus olhos brilhavam de felicidade e esperança. Aproximou-se determinado e tentou arrumar as flores, estendendo-as para a menina. Não disse uma palavra.

Ela, que parecia recém-chegada à cena, olhou-o com curiosidade, mas logo abriu um sorriso. Diferente dele, ela não era tímida ou guardava os sentimentos para si. Logo o abraçou, tascando-lhe um beijo na bochecha e aceitando o ramo, que cheirou como se fosse o perfume mais doce, com olhos fechados, como se viajasse para outro local. 
 O menino ficara da cor dos cabelos dela, petrificado. Quando ela levantou o rosto do buquê improvisado e sorriu novamente, ele relaxou. E sentou no chão. Aguentara a dor da queda até o momento, mas precisava descansar. O pai dele o tomou nos braços, levando-o para a casa para fazer curativos. Por cima do ombro do homem, o menino continuava olhando a menina que ia sorridente logo atrás. Ela desviou o olhar dela somente uma vez e acenou, como se dissesse adeus à incerteza.

3.5.11

Pequenos prazeres, Amélie Poulain


A vida toda somos acostumados com a gratificação como finalidade, mesmo que a situação pela qual tenham que passar possa ferir alguém ou simplesmente ser desnecessária. Alguns procuram pessoas para algo rápido, mas prazeroso. Outras têm a necessidade suplantada constantemente por anúncios de novos objetos de desejo que logo se tornam essenciais na vida diária, onde devemos estar todos inseridos e atuantes. Mas não precisamos realmente desses prazeres impostos, podemos aproveitar aqueles pequenos e quase esquecidos no dia-a-dia.

Os pequenos prazeres, como dito no filme O Fabuloso Destino de Amélie Poulain, que revelam muito da personalidade, até da alma de cada um e, portanto, muitos escondem para si. Seja colocar as mãos dentro de um saco com grãos; sentir o aroma do café; o vento no rosto; o ronronar de um gato; o relevo da pele de alguém ou simplesmente observar as nuvens. O que importa é ter esse prazer e ter tempo para desligar-se do mundo, entregando-se ao momento e conseguindo assim relaxar. Mas o mundo não espera e logo seremos tragados de volta, mas podemos voltar um pouquinho mais felizes.